Brasil deve um tratamento mais digno às crianças com deficiência

O Dia Nacional da Criança com Deficiência tem como objetivo chamar a atenção da população para a necessidade de compreensão sobre esse universo e de respeito para com as crianças.
Comissão do Senado aprovou projeto de lei que torna obrigatória a existência de 5% de brinquedos adaptados em parques e vias públicas do país (Foto: radiocatedral.com.br)

A infância é, provavelmente, a fase mais importante da vida de todos nós. Não existem as responsabilidades e as pressões da vida adulta nem as dúvidas e as incertezas da adolescência. Há sempre uma família para proteger e dar amor, carinho e proteção. As únicas tarefas são brincar, ser feliz e, claro, moldar a personalidade e o caráter. Esses conceitos valem para todo tipo de criança – pobres e ricas, negras ou brancas, deficientes ou saudáveis. Em teoria. Na prática, a realidade é diferente. Crianças brancas, ricas e saudáveis têm muito mais oportunidades de desfrutar as delícias da infância do que crianças negras, pobres e com deficiência.

O primeiro parágrafo deste texto se torna necessário, especialmente, no dia de hoje, 09 de dezembro, em que é celebrado o Dia Nacional da Criança com Deficiência. A data tem como objetivo chamar a atenção da população para a necessidade de compreensão sobre esse universo e de respeito para com as crianças, além de incentivar a promoção da melhoria da sua qualidade de vida. Segundo relatório do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), existem cerca de 240 milhões crianças com deficiência no mundo. No Brasil, são cerca de 760 mil.

Uma das principais dificuldades de ser criança com deficiência é a ausência de espaços pensados para atender a este público. Embora exista a lei nº 10.098 de 2000, que estabelece a promoção da acessibilidade para pessoas com deficiência, alterada em 2010 (lei nº 11.982) e em 2017 (lei nº 13.443), que inclui no mínimo 5% de cada brinquedo e equipamento de lazer adaptados, em locais públicos e privados, o que se vê é uma quantidade ínfima de parques e praças com brinquedos acessíveis a crianças com deficiência ou mobilidade reduzida.

Crianças cegas ou surdas sofrem com a ausência de intérpretes de Libras ou audiodescrição em shows voltados para o público infantil, como no Dia das Crianças, Carnaval, São João, etc. Em termos educacionais, a situação piora consideravelmente. Fazendo uma comparação rasa entre as crianças com deficiência e as saudáveis, percebe-se que as crianças deficientes têm 49% mais chances de nunca ter frequentado a escola. Outro índice alarmante aponta que 47% das crianças com deficiência têm mais chances de estar fora do ensino fundamental I, 33% fora do ensino fundamental II e 27% mais probabilidade de estar fora do ensino médio. Todos esses índices colaboram para que 51% das crianças com deficiência tenham mais probabilidade de se sentir infelizes e 41% mais probabilidade de se sentir discriminadas.

O relatório da UNICEF constatou que crianças com dificuldade de comunicação e de cuidar de si mesmas são as que têm maior probabilidade de estar fora da escola, independentemente do nível de escolaridade. As taxas de crianças e adolescentes fora da escola são mais altas entre crianças com deficiências múltiplas e as disparidades tornam-se ainda mais significativas quando a gravidade da deficiência é levada em consideração. As escolas não podem rejeitar pessoas com deficiência. Como qualquer cidadão, as pessoas com deficiência têm direito à escola regular com os devidos apoios e adaptação dos materiais para seu desenvolvimento. Também não é permitido cobrar taxas extras por isso.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) estabelece em seu artigo 11, §1º e §2º, que o atendimento médico seja realizado sem qualquer tipo de discriminação, além de assegurar o direito ao recebimento de órteses, próteses e outras tecnologias, gratuitamente. Em seu artigo 54, inciso III, o ECA determina que pessoas com deficiência tenham atendimento educacional especializado, preferencialmente, na rede regular de ensino. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/1996), também assegura atendimento educacional especializado aos educandos com deficiência, assim como a Lei Brasileira de Inclusão (LBI), Lei No. 13.146/2015. Diante de tanta legislação garantindo o acesso das crianças com deficiência às escolas regulares, sem barreiras e sem cobrança de taxas extras, por que existe tanta discrepância entre crianças com e sem deficiência?

A resposta a esta pergunta é o cerne deste texto e convido a todos refletir sobre o tema. Se a infância é o futuro da humanidade, as crianças deficientes pertencem a este futuro. Precisamos exigir do Poder Público ações concretas para aplicação das leis e uma maior conscientização na sociedade para a inclusão das crianças em todos os espaços. As pessoas com deficiência já percorreram um longo caminho, mas ainda falta. Vamos tentar olhar o mundo pelos olhos das crianças com alguma deficiência ou limitação de movimento e tentar entender como elas se sentem ao serem excluídas dos aniversários dos amiguinhos, das brincadeiras nos parques e pracinhas, das festas de Dia das Crianças. No dia que conseguirmos sentir o que elas sentem, o país vai dar um passo gigantesco rumo ao futuro.

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